Até pouco tempo atrás, Belo Horizonte ficava praticamente deserta no carnaval. Itaguara, Carmópolis, Crucilândia, Piracema e as cidades da região lotavam com os turistas vindos de BH e da Região Metropolitana em busca de folia, natureza e descanso. As vagas nos hotéis se esgotavam, as ruas ficavam lotadas e os comerciantes vendiam muito no período carnavalesco. Mas há menos de 15 anos a realidade mudou drasticamente e, agora, BH é quem recebe turistas de cidades do interior, e as prefeituras têm o desafio de reerguer seus carnavais cada vez mais esvaziados.
O cenário começou a mudar a partir de 2010, quando o carnaval belorizontino foi retomado com força a partir de movimentos organizados à revelia do poder público. A prefeitura da capital não apenas não apoiou, num primeiro momento, a retomada do carnaval como reprimiu a festividade e quaisquer concentrações populares.
Em dezembro de 2009, um decreto do ex-prefeito Marcio Lacerda proibiu a realização de eventos de qualquer natureza na Praça da Estação. A resposta popular foi a "Praia da Estação", (que hoje dá nome a um dos mais tradicionais blocos carnavalescos da capital) em 2010, um movimento que transformou a cidade sem mar em um litoral de alegria, ao som de marchinhas. Naqueles anos, a cidade não fez carnavais grandiosos, no entanto em poucos anos o carnaval de BH passou a figurar entre os maiores do Brasil, com avaliações altamente positivas por parte dos foliões.
Já em 2015, um dos anos marcantes da retomada do carnaval, mais de 1,5 milhão de pessoas foram às ruas. Com o aumento da visibilidade da festa, coube ao poder público fornecer maior estrutura e apoios aos blocos.
Em 2023, a capital mineira atraiu, com a volta do carnaval, cerca de 5 milhões de pessoas para as ruas, fazendo com que a festa se consolidasse como uma das maiores do Brasil. Após dois anos sem festejos carnavalescos em função da pandemia, a prefeitura belorizontina estimou que a festa deste ano tenha movimentado algo em torno de R$ 600 milhões, gerando R$ 24 milhões para os cofres públicos municipais com a arrecadação de impostos.
Outro dado importante diz respeito à criação de empregos. De acordo com estimativas realizadas pelo Observatório do Turismo da Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte (Belotur), o carnaval criou cerca de 20 mil postos de trabalho, aquecendo a economia da capital.
Uma pesquisa realizada pelo Sistema Fecomércio com o apoio da Belotur, revelou que o carnaval belorizontino tem uma adesão superior a 90%. Ainda de acordo com o levantamento, 4,3% das pessoas que pretendiam participar do carnaval de BH este ano são de outros estados e 0,3%, de outros países - ou seja, dos 5 milhões de foliões, mais de 200 mil turistas vieram de fora de Minas Gerais.
Prefeitura da capital apoia blocos
Uma das forças motrizes do carnaval da capital é a quantidade e diversidade dos blocos carnavalescos, que arrastam verdadeiras multidões. Alguns levam mais de 200 mil pessoas para as ruas como o “Então, Brilha”, o “Baianas Ozadas” e o “Quando Come se Lambuza”.
A Prefeitura de Belo Horizonte tem realizado, nos últimos anos, significativos investimentos para contribuir com os principais atores do carnaval. Em outubro de 2022, a PBH publicou um Edital de Auxílio Financeiro, contemplando 95 blocos de rua, com valor global investido de R$ mais de 1,5 milhão. Ainda no ano passado, a Belotur lançou três editais, investindo quase R$ 4 milhões na cadeia produtiva do carnaval, contemplando 71 blocos carnavalescos.
Segurança: ponto positivo
A Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) avalia positivamente o trabalho feito no carnaval. Apesar de ainda não haver um balanço estatístico final da festividade, o chefe do Centro de Jornalismo da Polícia Militar de Minas Gerais, tenente-coronel Flávio Santiago, ressaltou que o planejamento prévio coibiu crimes e confusões.
Diversos veículos de comunicação também enfatizaram a visão positiva dos foliões com relação à segurança pública durante os festejos carnavalescos na capital.
No interior: público menor
Por outro lado, ao contrário do sucesso da capital, o carnaval tem sido um grande problema para prefeitos e secretários de cultura das cidades pequenas, principalmente aquelas próximas a Belo Horizonte.
Com recursos escassos em comparação com a capital mineira, as prefeituras pequenas tem se reinventado para tentar frear a perda de público nos carnavais locais. Algumas cidades têm apostado nos bloquinhos caricatos, assim como BH; outras, diversificam a programação com DJ’s e bandas de axé.
Em Itaguara
Em Itaguara, notou-se um público menor na praça, em comparação com anos anteriores, principalmente nas noites de segunda e terça-feira. “Nitidamente, o carnaval está tendo menos público ano após ano. Não sei porquê mas acho que é por causa do carnaval de BH, né? ”, disse uma das fontes ouvidas pelo SN.
Um outro fator tem contribuído para o menor público do carnaval da região, incluindo Itaguara: o medo da violência. De acordo com um vereador que entrou em contato com o SN, o crescimento da violência tem assustado moradores que preferem ficar em casa ao celebrarem nas ruas. "Há pouco tempo, aconteceu tiroteio na praça, isso tem assustado muito as pessoas", afirmou o edil.
No entanto, um ponto elogiado no carnaval de Itaguara este ano foi justamente a segurança. Além de maciça presença de seguranças privados e policiais militares, todas as entradas para a Praça do Santuário estavam monitoradas e os foliões precisavam, obrigatoriamente, passar por revista.
Crucilândia
Em Crucilândia, também houve reclamação de uma das bandas que se apresentou no evento. “Instrumentistas até que são bons, mas os cantores são ruins demais. Todo mundo na praça reclamando”, disse um dos comentários na própria página da prefeitura.
Piracema e Carmópolis de Minas
As prefeituras de Piracema e Carmópolis de Minas não divulgaram fotos ou vídeos dos festejos carnavalescos, mas leitores do SN de ambas as cidades enviaram fotos e comentários.
“Vazio não estava, mas a sensação que passa pra gente é que fica aqui quem não tem condições de ir para outro lugar no carnaval”, consta em uma das mensagens enviadas pelo Instagram do Sagarana Notícias.
Não houve alto engajamento nas redes sociais destas prefeituras, o que também comprova a baixa empolgação das populações locais com o carnaval de 2023. Observam-se poucas curtidas nas publicações relacionadas ao carnaval e pouquíssimos comentários.
Indagações que ficam
O carnaval de 2023 terminou com muitos questionamentos sobre a possibilidade de a festa se reerguer e ainda ser sucesso de público e crítica nas cidades da região.
Este é um dos tantos desafios para os gestores municipais. Se competir com o carnaval da capital é difícil ou até mesmo impossível, como então organizar festividades carnavalescas atrativas, seguras e autênticas? Eis uma das tantas indagações que ficam a partir desta quarta-feira de cinzas.
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